terça-feira, 19 de outubro de 2021

Padres "comunistas", por Frei Sérgio Antônio Görgen

 Nos idos dos anos 80 do século passado fui muitas vezes achacado com esta consigna “padre comunista”.

Mais recentemente fui batizado de “frei melancia”. Diz que é “ecologista”, mas é mesmo “comunista”: verde por fora, vermelho por dentro.

Nos mesmos idos de 80 recebi duas cartas ameaçadoras do CCC – Comando de Caça aos Comunistas. Ameaçavam me esfolar e até eliminar caso não me convertesse ao que achavam ser o “verdadeiro” cristianismo. Nunca me tiraram um único minuto de sono.

Não pensei que este besteirol um dia voltasse. Pois não é que voltou! Qualquer frase solta que fale em libertação, defesa de direitos, anti-fascismo, sociedade solidária, já vem a pecha: padre comunista.

Embora vivendo a vocação de simples frade, consagrado e não ordenado, pelo fato de estar há muitos anos com “sem terra”, camponeses, pequenos agricultores, indígenas, quilombolas, pescadores, defendendo suas causas e lutando por distribuição de terras e rendas, estou no rol dos ditos cujos e, inclusive, me promovem a “padre”.

Nem hoje me tiram o sono. Sei a fé que abracei.

Mas me imaginei num tribunal inquisidor formado por católicos tradicionais, rançosos e raivosos, enfeitiçados pelo bolsonarismo, convencidos até à medula da autenticidade pura e única de sua religião medieval pintada de nova com o uso das modernas redes sociais.

Para evitar ser crucificado com esta acusação no tribunal das novas mídias pensei numa fortificada linha de defesa: vou me ancorar na Bíblia.

Aí comecei a perceber que minha defesa tem vários furos e fiquei com medo de ser, mesmo com tão poderosa defesa, condenado.

Então resolvi tomar uma providencial providência: vou rasgar da Bíblia os textos que podem me condenar.

Comecei rasgando os 4 primeiros capítulos dos Atos dos Apóstolos. Aquelas partes que dizem que “os cristãos tinham tudo em comum e não havia necessitados entre eles” e “vendiam os seus bens e colocavam o valor aos pés dos apóstolos” para repartir com os necessitados, poderiam me condenar. E ainda o apóstolo Pedro dizendo que “Deus não faz distinção de pessoas” … Nossa! Comunismo puro.

Depois arranquei a Carta de Tiago inteira. Aquela mania de São Tiago em dizer que “a fé sem obras é morta” e que “ricos, vossa riqueza apodreceu” e “os gritos dos ceifadores de quem vocês tiraram o salário chegaram aos ouvidos de Deus”. Preocupante. Inútil para minha defesa.

Depois comecei a dar uma repassada nos Evangelhos. Fiquei preocupadíssimo com o Cântico de Maria, no Evangelho de Lucas. Nossa Senhora rezando que Deus “vai derrubar os poderosos de seus tronos e exaltar os humildes, saciar os famintos e despedir os ricos de mãos vazias”. PelamordeDeus. Rasguei na hora. Além de me condenar, poderia atrapalhar muitos inescrupulosos que usam as devoções marianas do povo simples para ajuntar dinheiro e falar mal do Papa Francisco e da Igreja comprometida com os pobres, em nome de Nossa Senhora.

Rasguei também a parábola do rico comilão e do pobre Lázaro. Rasguei e queimei, para não deixar vestígios, a passagem dos trabalhadores desempregados na praça que receberam o mesmo valor dos contratados mais cedo, pois podem interpretar “de cada um conforme sua capacidade e a cada um conforme sua necessidade”; também aquelas em que Jesus distribui pães e peixes às multidões famintas; eliminei todas onde Ele convida doentes, coxos, mendigos, pobres, abandonados para o banquete do Reino para o qual os “bem de vida”, convidados, recusaram; destruí várias em que Jesus diz “vai, vende o que tens, dá aos pobres e depois vem e segue-me”; aquelas do camelo passando pelo buraco da agulha antes de ricaços aceitarem o Reino de Deus… Credo. Comunismo puro na mente desta gente cega de ódio.

Arranquei também o Pai Nosso. Vai que atentem que o Mestre ensinou a orar pela vinda do Reino e pelo cumprimento de Sua vontade “assim na terra como no céu”. Esta coisa do Reino na terra, aqui neste mundo, não, não, não. “O meu Reino não é deste mundo”. Esta é a interpretação correta. Reino também neste mundo, é Teologia da Libertação. E TdL é comunismo. E depois aquela parte de pedir “o pão nosso de cada dia”, nem pensar. Comida para todos é coisa de comunista. Para evitar problemas, rasguei.

A expulsão dos vendilhões do templo, eliminei nos quatro Evangelhos. Credo. Uma da poucas vezes que o Mestre enraiveceu foi quando viu comércio com a fé do povo. Risco grande de Ele também ser classificado como comunista. Proibir arrancar dinheiro do povo em troca de bençãos, curas, preces e graças, comunismo puro.

Aquela parábola do Samaritano fazendo o que sacerdotes e pastores deviam fazer e não fizeram, acolhendo e cuidando do pobre jogado à beira da estrada, fiquei mesmo em dúvida. Porque caridade assistencial, pode. O que não pode é perguntar: quem o assaltou? quem o roubou? Talvez por isto os servos do templo preferiram passar ao largo. Aproximar-se dos pobres pode levar a compromissos mais profundos. Droga. Já estou com argumentação comunista para a mente poluída dos que me acusam. Sem riscos. O Evangelho de Lucas não terá mais esta parábola quando o apresentar em minha defesa. 

Rasguei também as Bem Aventuranças e as mal aventuranças de Lucas. “Bem aventurados vós os pobres”, “Malditos vocês ricos”, doideira, luta de classes, marxismo, vade retro, satanás. “Bem aventurados os que tem fome e sede de justiça”, de Mateus, excluí também.  Olhei melhor e excluí também, em Mateus, a bem aventurança da paz, pois agora são tempos de armas e cruzadas contra os inimigos e hereges. Falar de paz contraria o novo “messias” da metralhadora no lugar do feijão.

Bah. E aquele texto em que Jesus afirma “vós TODOS” sois irmãos”. Vai que neste TODOS imaginem que estejam “sem terra”, negros, índios, LGBTQI+, “sem teto”, migrantes, moradores de rua, “todos estes que não prestam”… Meus IRMÃOS, estes? Nem a peso de ouro. Comunismo. Página rasgada.

E aquela cena de lavar os pés dos discípulos e dizer: “os grandes da terra dominam com tirania, entre vocês não seja assim”. Quebra de hierarquia social. Sem dúvida, comunismo. Decidi não correr risco e página no fogo.  

Tomei algumas precauções a mais: eliminei a passagem de João em que uma mulher surpreendida em adultério ia ser apedrejada e Jesus não deixou. Vão pensar que defendo pessoas de “má vida”. Além do mais, poderia perguntar: por que o homem adúltero estava livre das pedradas? Esta mania de fazer perguntas que levem a pensar é coisa de Paulo Freire, um comunista-mor.

Eliminei também aquela em que Marta pediu que Maria voltasse para a cozinha e Jesus garantiu o direito de as mulheres participarem do mesmo círculo que os homens em pé de igualdade. As mulheres podem querer exigir demais baseadas nisto. Risco eliminado. Feminismo é fruto do comunismo, e ponto final.

 Aí passei a me preocupar com o Antigo Testamento. Rasguei o profeta Isaias inteiro. Muito perigoso. Depois Amós. Eliminei Oseias. Retirei Miqueias. Muito contra a exploração e a favor dos injustiçados. E ainda Esdras e Neemias assembleistas e distributivistas demais. Não me ajudarão na defesa.

Minha Bíblia estava ficando pequena, mas, paciência, eu precisava salvar meu couro da sanha anticomunista.

Aí passei a me preocupar com o Êxodo. Organizar escravos, enfrentar governantes tiranos, acampar em deserto e conquistar terra prometida, e Deus apoiando, credoemcruz, isto é MST na veia, comunismo da gema. Eliminei o livro inteiro.

Mas aí lembrei também de Levítico e Deuteronômio. Aquelas leis para garantir justiça, estabelecer ano sabático para devolver terras, e ainda dizer “que entre vós não existam pobres”… Perigoso demais. Dois livros a menos.

Aí cansei. A Bíblia já estava miudinha. Preservei os textos de Salomão cobrando impostos pesados ao povo, vivendo no luxo, com 700 esposas oficiais e mais 300 concubinas. Este sim, garanto que não tem nada de comunista. Façamos templos e altares a Salomão.

Até pensei em argumentar que os primeiros defensores modernos de uma sociedade de iguais, embora utópica, foram dois pensadores cristãos: Morus e Campanela.

Também pensei em fazer distinção entre socialismo e comunismo, para que, pelo menos, se saiba do que se está falando quando se multiplicam falas superficiais por aí afora sobre o tema. E que o socialismo, como movimento histórico, despido de ateísmo e totalitarismo, recebeu abertura para engajamento cristão na encíclica Octogésima Adveniens do Papa São Paulo VI.

Mas acho que diante de tanta pequenez intelectual e tanto fanatismo cego, de pouco adiantará.

Talvez nem minha diminuta Bíblia rasgada e purificada me sirva de defesa.

Mesmo assim continuarei frade engajado nas lutas sociais em defesa dos desprotegidos, excluídos e explorados, anti-capitalista, socialista e seguidor de Jesus de Nazaré, o Cristo Crucificado e Ressuscitado.

Melhor ser acusado de comunista do que ser, de fato, alienado, omisso, em má consciência com a fé que professo.

Me chamem do que quiserem e me ataquem como quiserem.

Mas, por preferência, gostei mais de ser chamado de “frei melancia”: aquele suco vermelho é muito doce.  


Frei Sérgio Antônio Görgen ofm – Frei Franciscano, militante do MPA, autor de “Em Prece com os Evangelhos”.

quinta-feira, 30 de setembro de 2021

Por que a violência no Antigo Testamento?

Muitos fazem esta pergunta. Pois bem, o frei Inácio Cantalamessa, O.F.M, Capuchinho, Pregador do Papa, na Basílica de São Pedro, no dia 03 de abril de 2015, Sexta-feira Santa disse algo muito interessante. Transcrevo aqui o que ele disse:

“Alguém poderia objetar: mas a Bíblia também não está cheia de histórias de violência? Deus mesmo não é chamado de “Senhor dos Exércitos”? Não é atribuída a Ele a ordem de exterminar cidades inteiras? Não é Ele quem decreta, na Lei mosaica, numerosos casos de pena de morte?

Se tivessem dirigido a Jesus, durante a sua vida, esta mesma objeção, Ele certamente teria respondido o que respondeu sobre o divórcio: “Foi por causa da dureza do vosso coração que Moisés vos permitiu repudiar vossas mulheres, mas no princípio não foi assim” (Mt 19,8). Também sobre a violência, “no princípio não foi assim”. O primeiro capítulo do Gênesis mostra um mundo onde a violência não é sequer pensável, nem dos seres humanos entre si, nem entre homens e animais. Nem sequer para vingar a morte de Abel, e assim punir um assassino, é lícito matar (cf. Gn 4, 15).

O genuíno pensamento de Deus é expresso pelo mandamento “Não matarás”, e não pelas exceções abertas na Lei, que são concessões à “dureza do coração” e dos costumes dos homens. A violência, depois do pecado, infelizmente faz parte da vida; e o Antigo Testamento, que reflete a vida e deve servir à vida, procura pelo menos, com a sua legislação e com a própria pena de morte, canalizar e conter a violência para que ela não se degenere em arbítrio pessoal. [Cf R. Girard, Delle cose nascoste sin dalla fondazione del mondo, Adelphi, Milão 19963.].

Paulo fala de uma época caracterizada pela “tolerância” de Deus (Rm 3, 25). Deus tolera a violência como tolera a poligamia, o divórcio e outras coisas, mas educa o povo para um tempo em que o seu plano original possa ser “recapitulado”, como para uma nova criação. Esse tempo chega com Jesus, que, na montanha, proclama: “Ouvistes o que foi dito: olho por olho, dente por dente; mas eu vos digo: não resistais aos malvados; se alguém vos bater na face direita, oferecei também a outra… Ouvistes o que foi dito: amai o vosso próximo e odiai o vosso inimigo; eu, porém, vos digo: amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem” (Mt 5,38-39; 43-44).

O verdadeiro “sermão da montanha” que mudou o mundo, no entanto, não é aquele que Jesus fez um dia sobre uma colina da Galileia, mas aquele que Ele proclama agora, silenciosamente, na cruz. No Calvário, Ele pronuncia um definitivo “não!” à violência, opondo a ela não apenas a não-violência, mas o perdão, a bondade e o amor. Se ainda houver violência, ela já não poderá, sequer remotamente, remontar a Deus e revestir-se da sua autoridade. Fazer isto significa retroceder na ideia de Deus a estágios primitivos e grosseiros, superados pela consciência religiosa e civil da humanidade” (Fim da pregação de Cantalamessa).

A história de Israel é a história de uma educação de um povo que vivia no meio dos pagãos, muitos deuses e repletos de costumes errados que penetraram na sua cultura. Esse “limite da cultura”, como diz Bento XVI, não permitia ainda a Deus fazer o povo entende-lo de outra maneira. Então Deus tolera o divórcio, a poligamia, e outros erros que vemos o Antigo Testamento. Mas, devagar, por fases, Deus faz seu povo sair da violência em Seu Nome, até o dia em que Jesus diz no Sermão da Montanha: “Bem-aventurados os mansos”.

Deus é paciente porque é eterno; não tem pressa; Ele sabe que existe um caminho para lidar com a nossa dureza de coração, tibieza de alma e preguiça espiritual; então vai devagar conosco para que não o abandonemos de vez. Na cultura e na moral da época, esse agir “violento” de Deus, era, para o povo, normal e legítimo. Ninguém entende a história se não entende a mentalidade da época em que os fatos aconteceram. Esta é a nossa dificuldade para entender o passado.

No começo da Bíblia, os primeiros capítulos do livro do Gênesis falam da criação e da origem da humanidade: a violência não tem sua origem em Deus. A primeira consequência do pecado é a violência. Em meio à rivalidade, Caim mata Abel. Deus quer acabar com o ciclo infernal da violência e protege Caim; não permite que outros o matem. Mas a violência continua. E aumenta tanto que Deus se arrepende de ter criado o homem. “A terra está repleta de violência por causa dos homens”, diz a Noé. E Deus faz um novo começo, a partir do único justo que encontra: Noé e sua família!

Deus permite que o dilúvio elimine pecadores e pecados. Não é vingança divina; é correção; a Justiça perfeita de Deus, mas não pode deixar indefinidamente que se propaguem o mal, a injustiça, a violência, o pecado. Então, Ele corrige o homem segundo os seus costumes, sua época, sua mentalidade.

Muitas passagens da Bíblia utilizam uma linguagem de imagens. E não podemos, com mentes superficiais, encarar isso com superficialidade. Por exemplo, Deus impediu que Abraão lhe oferecesse seu filho em sacrifício e esta proibição permanecerá. Abraão estava acostumado com sacrifícios humanos aos deuses da Babilônia, de Ur na Caldeia, de onde Deus o tirou. Por isso Ele aceitou sacrificar Isac, mas Deus só estava testando o seu amor.

Outro exemplo: Em Jerusalém, o vale de Geena está amaldiçoado porque reis ímpios acreditavam atrair os favores divinos sacrificando seus filhos e filhas. Deus condena isso, no profeta Jeremias: “Uma coisa dessas eu nunca mandei fazer!” (Jr 7, 31).

Ainda: Deus faz chover fogo sobre Sodoma, para eliminar seu pecado. Ali não havia dez justos pedido por Abraão. Dois Apóstolos (o meigo João e Tiago) queriam, um dia, fazer descer fogo do céu sobre os samaritanos, por terem rejeitados Jesus. O Mestre os repreende: “quero misericórdia!”. “Vocês não sabem que espírito os anima”. Deus não é violento: é justo e protege seu povo.

Naquele mundo imerso na violência, o povo de Israel, também acostumado com ela, se encontra em estado de guerra ao chegar a Palestina, saindo livre do Egito. Está em jogo a sua independência nacional e também religiosa, por isso, entra em combate com os povos que o cercam. Era algo normal naquele tempo, naquela cultura: a guerra era uma atividade cotidiana. As guerras de Israel têm, portanto, segundo o costume válido, um objetivo sagrado. Deus é o “Senhor dos exércitos” celestiais, e também dos exércitos de Israel que defendem a sua independência religiosa. Dai vai nascer o Salvador de todos os homens.

Outro fato importante, é que Israel está misturado com povos pagãos, cheios de idolatria, e maus costumes, correndo o risco de adotar também os seus deuses, como aconteceu muitas vezes. Por isso, o desejo de “pureza religiosa” levou ao aniquilamento de algumas populações. Mas este tipo de conduta, pouco frequente, teve muitas vezes causas muito mais mundanas.

Israel foi mais vítima da violência que autor dela. A mudança total de perspectivas é anunciada pelas profecias de Isaías do Servo de Deus: “Meu servo justificará muitos e suportará as culpas deles” (Is 53,11).

Portanto, é preciso entender que a violência na Bíblia é a história da educação de um povo, que sai do mundo pagão, violento, para se tornar o povo de Deus, de onde virá a Salvação. Onde não está presente a violência na nossa sociedade, no nosso mundo, e também nos nossos corações? O século XX foi o século mais violento da história. E o XXI já parece ultrapassá-lo.

Se existe ódio, ele se dirige a todas as formas do mal: a rejeição de Deus, a falsidade, a injustiça, o desprezo dos outros, da sua dignidade, dos seus bens. É preciso odiar o pecado e amar o pecador. É o que o autor do salmo citado não podia entender: “Com grande ódio eu os odeio”; é o que Jesus realizou perfeitamente e que seus adversários não entenderam.

Como devemos interpretar, hoje, os inimigos do povo de Deus no Antigo Testamento? Sobretudo as forças do mal que combatem contra Deus, Seu Reino, e contra a Igreja. Não mais serão vencidos pelas forças dos cavalos, das lanças e das espadas, mas pelo poder de Deus, como Jesus ensinou no Sermão da Montanha.

segunda-feira, 19 de abril de 2021

Jesus não é um "fantasma", mas uma Pessoa viva!

Estimados irmãos e irmãs, bom dia!

No terceiro domingo de Páscoa (18/04/2021), voltamos a Jerusalém, ao Cenáculo, como que guiados pelos dois discípulos de Emaús, que tinham ouvido com grande emoção as palavras de Jesus ao longo do caminho e depois o reconheceram «ao partir o pão» (Lc 24, 35). Agora, no Cenáculo, Cristo ressuscitado apresenta-se no meio do grupo de discípulos, saudando-os: «A paz esteja convosco!» (v. 36). Mas eles, assustados e perturbados, pensaram que «viam um espírito», assim diz o Evangelho (v. 37). Então Jesus mostra-lhes as feridas do seu corpo e diz: «Vede as minhas mãos e os meus pés – as chagas – sou eu mesmo; palpai-Me e vede» (v. 39). E para os convencer, pede comida e come-a sob os seus olhares atônitos (cf. vv. 41-42).

Há aqui um detalhe nesta descrição. O Evangelho diz que os Apóstolos, «vacilando eles ainda e estando transportados de alegria», não acreditavam. Tal era a alegria que sentiam, que não podiam acreditar que o que viam era verdadeiro. E um segundo detalhe: ficaram estupefatos, surpreendidos; admirados pois o encontro com Deus leva sempre à admiração: vai além do entusiasmo, além da alegria, é outra experiência. E eles rejubilaram, mas um júbilo que os fez pensar: não, isto não pode ser verdade!... É o espanto da presença de Deus. Não vos esqueçais deste estado de espírito, que é tão bom.

Esta página do Evangelho é caracterizada por três verbos muito concretos, que num certo sentido refletem a nossa vida pessoal e comunitária: ver, tocar e comer. Três ações que podem proporcionar a alegria de um verdadeiro encontro com Jesus vivo.

Ver. «Vede as minhas mãos e os meus pés» – diz Jesus. Ver não é apenas olhar, é mais, requer também a intenção, a vontade. É por isso que é um dos verbos do amor. A mãe e o pai veem o filho, os amantes veem-se um ao outro; o bom médico vê o paciente com atenção... Ver é um primeiro passo contra a indiferença, contra a tentação de virar o rosto para o outro lado face às dificuldades e sofrimentos dos outros. Ver. Vejo ou olho para Jesus?

O segundo verbo é palpar. Convidando os discípulos a palpá-lo, a ver que ele não é um fantasma – palpai-me!  –  Jesus indica a eles e a nós que a relação com Ele e com os nossos irmãos não pode permanecer “à distância”, não existe um cristianismo à distância, não existe um cristianismo apenas ao nível do ver. O amor pede que se veja mas também a proximidade, pede contato, a partilha da vida. O Bom Samaritano não se limitou a olhar para o homem que encontrou meio morto ao longo do caminho: parou, inclinou-se, ligou as suas feridas, tocou-o, carregou-o no seu cavalo e levou-o para a estalagem. O mesmo seja feito com o próprio Jesus: amá-lo significa entrar numa comunhão de vida, uma comunhão com Ele.

E chegamos ao terceiro verbo, comer, que exprime bem a nossa humanidade na sua natural indigência, ou seja, a necessidade de nos alimentarmos para viver. Mas comer, quando o fazemos juntos, em família ou entre amigos, torna-se também uma expressão de amor, uma expressão de comunhão, de festa... Quantas vezes os Evangelhos nos mostram Jesus a viver esta dimensão de convívio! Também como Ressuscitado, com os seus discípulos. Ao ponto que o Banquete eucarístico se tornou o sinal emblemático da comunidade cristã. Comer juntos o Corpo de Cristo: este é o centro da vida cristã.

Irmãos e irmãs, esta página do Evangelho diz-nos que Jesus não é um “fantasma”, mas uma Pessoa viva; que quando Jesus se aproxima de nós enche-nos de alegria, a ponto de não acreditar, e deixa-nos estupefatos, com aquele espanto que só a presença de Deus dá, porque Jesus é uma Pessoa viva. Antes de tudo, ser cristão não é uma doutrina ou um ideal moral, é a relação viva com Ele, com o Senhor Ressuscitado: vemo-Lo, palmamo-Lo, alimentamo-nos d’Ele e, transformados pelo seu Amor, vemos, palpamos e alimentamos os outros como irmãos e irmãs. A Virgem Maria nos ajude a viver esta experiência de graça.

(PAPA FRANCISCO, REGINA CAELI, Praça São Pedro, Domingo, 18 de abril de 2021)



segunda-feira, 22 de março de 2021

Crucifixo de Salvador Dali inspirado em São João da Cruz

 



      São João da Cruz, em suas contemplações místicas, desenhou Cristo crucificado de uma forma diferente da que geralmente vemos. Ele desenhou o crucificado visto de cima. Uma visão que tiveram os anjos e o próprio Deus Pai. Um Cristo crucificado que olha sempre para a humanidade.

      Alguns anos depois, o artista plástico Salvador Dali faz uma magnífica obra de Cristo crucificado inspirando-se no desenho de São João da Cruz. Uma composição triangular, tanto pelo desenho da cruz quanto pelo desenho do corpo de Cristo. Os braços de Jesus estão em forma de arco, criando assim uma força que direciona para baixo. São três forças que impulsionam o Cristo para baixo. E abaixo da cruz encontra-se a humanidade simbolizada pelo horizonte, pelo mar, pelos barcos e pescadores. Percebemos que Cristo está pendente na cruz sem os pregos e sem a coroa de espinhos. Mas como Cristo se sustenta na cruz sem pregos? O que sustenta Jesus na cruz nunca foram os pregos e sim o grande amor pela humanidade.

     Ao contemplar o crucificado iremos sentir em nosso coração a imensidão do amor de Deus pela humanidade. Não há maior amor daquele que dá a vida pelos seus amigos!

Pedro Debarba - Teólogo











quarta-feira, 10 de março de 2021

 INTERVENÇÃO DO CARDEAL JOSEPH RATZINGER DURANTE O CONGRESSO DOS CATEQUISTAS E DOS PROFESSORES DE RELIGIÃO

10 de Dezembro de 2000

 

A nova evangelização

 
 
A vida humana não se realiza por si só. A nossa vida é uma questão aberta, um projeto incompleto que ainda deve ser terminado e realizado. A pergunta fundamental de cada homem é:  como se realiza isto tornar-se homem? Como se aprende a arte de viver? Qual é o caminho da felicidade?

Evangelizar significa:  mostrar este caminho. Jesus diz no início da sua vida pública:  Vim para evangelizar os pobres (cf. Lc 4, 18); isto significa:  eu tenho a resposta para a vossa pergunta fundamental; eu indico-vos o caminho da vida, o caminho da felicidade ou melhor:  eu sou esse caminho. A maior pobreza é a incapacidade de alegria, o tédio da vida considerada absurda e contraditória. Esta pobreza hoje está muito difundida, em formas muito diferentes, quer nas sociedades materialmente ricas quer também nos países pobres. A incapacidade de alegria supõe e causa a incapacidade de amar, inveja, avareza todos estes são vícios que devastam a vida dos indivíduos e o mundo. Eis por que precisamos de uma nova evangelização se a arte de viver permanece desconhecida, tudo o mais deixa de funcionar. Mas esta arte não é objeto da ciência esta arte só pode ser comunicada por quem tem a vida aquele que é o Evangelho em pessoa.

I. Estrutura e método na nova evangelização

1. A estrutura

Antes de falar dos conteúdos fundamentais da nova evangelização desejaria dizer uma palavra acerca da sua estrutura e método adequados. A Igreja evangeliza sempre e jamais interrompeu o caminho da evangelização. Celebra todos os dias o mistério eucarístico, administra os sacramentos, anuncia a palavra da vida a palavra de Deus, empenha-se pela justiça e pela caridade. E esta evangelização dá frutos:  produz luz e alegria, dá o caminho da vida a muitas pessoas; há quem viva, muitas vezes sem saber, da luz e do calor resplandecente desta evangelização permanente. Contudo, observamos um processo progressivo e preocupante de descristianização e de perda dos valores humanos essenciais. Uma boa parte da humanidade de hoje não encontra na evangelização permanente da Igreja o Evangelho, ou seja, uma resposta convincente à pergunta:  como viver?

Eis por que procuramos, além da evangelização permanente, jamais interrompida e que nunca se deve deter, uma nova evangelização, capaz de se fazer ouvir por aquele mundo que não encontra o acesso à evangelização "clássica". Todos têm necessidade do Evangelho; o Evangelho destina-se a todos e não apenas a um círculo determinado, e portanto somos obrigados a procurar novos caminhos para levar o Evangelho a todos.

Mas também se esconde nisto uma tentação a tentação da impaciência, a tentação de procurar imediatamente o grande sucesso, de procurar os grandes números. E este não é o método de Deus. Para o reino de Deus e a evangelização, instrumento e veículo do reino de Deus, é sempre válida a parábola do grão de mostarda (cf. Mc 31-32). O reino de Deus recomeça sempre de novo sob este sinal. Nova evangelização não pode significar:  atrair imediatamente com novos métodos mais requintados as grandes multidões que se afastaram da Igreja. Não não é esta a promessa da nova evangelização. Nova evangelização significa:  não contentar-se com o fato de que do grão de mostarda cresceu a grande árvore da Igreja universal, não pensar que é suficiente que nos seus ramos muito diferentes as aves possam encontrar lugar mas ousar de novo com a humildade do pequeno grão, deixando para Deus quando e como crescerá (cf. Mc 4, 26-29). As grandes coisas começam sempre do pequeno grão e os movimentos em massa são sempre efémeros. Na sua visão do processo da evolução, Teilhard de Chardin fala do "branco das origens" (le blanc des origines):  o início das novas espécies é invisível e a investigação científica não o pode encontrar. As fontes são escondidas muito pequenas. Por outras palavras:  as grandes realidades iniciam-se em humildade. Deixemos de lado se e até que ponto Teilhard tem razão com as suas teorias evolucionistas; a lei das origens invisíveis diz uma verdade uma verdade presente precisamente no agir de Deus na história:  "Não te elegi porque és grande, ao contrário és o mais pequeno de entre os povos; elegi-te porque te amo...", diz Deus ao povo de Israel no Antigo Testamento e exprime desta forma o paradoxo fundamental da história da salvação:  sem dúvida, Deus não conta com os grandes números; o poder exterior não é o sinal da sua presença. Grande parte das parábolas de Jesus indicam esta estrutura do agir divino e respondem desta forma às preocupações dos discípulos, os quais esperavam outro tipo de sucesso e de sinais do Messias sucessos do gênero dos que Satanás ofereceu ao Senhor:  dou-te todos os reinos do mundo tudo isto... (cf. Mt 4, 9). Sem dúvida, Paulo, no final da sua vida, teve a impressão de ter levado o Evangelho aos confins da terra, mas os cristãos eram pequenas comunidades espalhadas no mundo, insignificantes segundo os critérios seculares. Na realidade foram o germe que penetrou na massa a partir de dentro e levaram em si o futuro do mundo (cf. Mt 13, 33). Um antigo provérbio diz:  "Sucesso não é um nome de Deus". A nova evangelização deve submeter-se ao mistério do grão de mostarda e não pretender produzir imediatamente a grande árvore. Nós ou vivemos demasiado na certeza da grande árvore que já existe ou na impaciência de possuir uma árvore maior, mais vital ao contrário, devemos aceitar o mistério que a Igreja é ao mesmo tempo grande árvore e pequeníssimo grão. Na história da salvação é sempre Sexta-Feira Santa e, contemporaneamente,  Domingo  de Páscoa...

2. O método

Desta estrutura da nova evangelização deriva também o método justo. Sem dúvida, devemos usar de modo razoável os métodos modernos para nos fazer ouvir, ou melhor:  para tornar acessível e compreensível a voz do Senhor... Não procuramos escuta para nós não queremos aumentar o poder e a extensão das nossas instituições, mas desejamos servir o bem das pessoas e da humanidade dando espaço Àquele que é a Vida. Esta expropriação do próprio eu oferecendo Cristo para salvação dos homens, é a condição fundamental do verdadeiro empenho pelo evangelho. "Vim em nome de Meu Pai e não Me recebestes, mas se vier outro, em seu próprio nome, recebê-lo-eis" (Jo 5, 43). O sinal distintivo do Anticristo é falar em seu nome. O sinal do Filho é a sua comunhão com o Pai. O Filho introduz-nos na comunhão trinitária, no círculo do eterno amor, cujas pessoas são "relações puras", o acto puro do doar-se e receber-se. O desígnio trinitário visível no Filho, que não fala em seu nome mostra a forma de vida do verdadeiro evangelizador aliás, evangelizar não é simplesmente uma forma de falar, mas uma forma de viver:  viver em escuta e fazer-se voz do Pai. "Não falará de Si mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido", diz o Senhor acerca do Espírito Santo (cf. Jo 16, 13). Esta forma cristológica e pneumatológica da evangelização é simultaneamente uma forma eclesiológica:  o Senhor e o Espírito constroem a Igreja, comunicam-se na Igreja. O anúncio de Cristo, o anúncio do reino de Deus pressupõe escuta da sua voz na voz da Igreja. "Não falará de Si mesmo" significa:  falar na missão da Igreja...
Desta lei da expropriação derivam consequências muito práticas. Todos os métodos razoáveis e moralmente aceitáveis devem ser estudados - é um dever fazer uso destas possibilidades de comunicação. Mas as palavras e toda a arte da comunicação não podem conquistar a pessoa humana naquela profundidade, à qual deve chegar o Evangelho. Há alguns anos li a biografia de um óptimo sacerdote do nosso século, Pe. Didimo, pároco de Bassano del Grappa (Itália, n.d.r.). Nas suas notas encontram-se palavras de ouro, fruto de uma vida de oração e de meditação. A respeito de nós diz Pe. Didimo:  "Jesus pregava de dia, de noite rezava". Com esta breve notícia, ele queria dizer:  Jesus devia obter de Deus os discípulos. Isto é válido sempre. Nós não podemos ganhar os homens. Devemos obtê-los de Deus para Deus. Todos os métodos são vazios sem o fundamento da oração. A palavra do anúncio deve estar sempre imersa numa intensa vida de oração.

Devemos dar um ulterior passo. Jesus pregava de dia, de noite rezava o que não é tudo. A sua vida inteira foi como mostra de maneira admirável o evangelho de São Lucas um caminho rumo à cruz, ascensão rumo a Jerusalém. Jesus não redimiu o mundo com palavras bonitas, mas com o seu sofrimento e a sua morte. Esta sua paixão é a fonte inexaurível de vida para o mundo; a paixão dá força à sua palavra.

O próprio Senhor estendendo e ampliando a parábola do grão de mostarda formulou esta lei de fecundidade na parábola do grão que, ao cair na terra, morre (cf. Jo 12, 24). Esta lei também é válida até ao fim do mundo e é juntamente com o mistério do grão de mostarda fundamental para a nova evangelização. Toda a história o demonstra. Seria fácil demonstrar isto na história do cristianismo. Desejo recordar aqui apenas o início da evangelização na vida de São Paulo. O sucesso da sua missão não foi o resultado de uma grande arte retórica ou de prudência pastoral; a fecundidade estava relacionada com o sofrimento, com a comunhão na paixão de Cristo (cf. 1 Cor 2, 1-5; 2 Cor 5, 7; 11, 10 s; 11, 30; Gl 4, 12-14). "Nenhum sinal será dado a não ser o sinal do profeta Jonas", disse o Senhor. O sinal de Jonas é Cristo crucificado são as testemunhas, que completam o "que falta aos sofrimentos de Cristo" (Cl 1, 24). Em todos os períodos da história verificou-se sempre de novo as palavras de Tertuliano:  o sangue dos mártires é semente.
Santo Agostinho diz o mesmo de uma maneira muito bonita, ao interpretar Jo 21, onde a profecia do martírio de Pedro e o mandato de apascentar, ou seja, a instituição da sua primazia, estão intimamente relacionados. Santo Agostinho comenta o texto de Jo 21, 16 da seguinte forma:  "Apascenta as minhas ovelhas", o que significa, sofre pelas minhas ovelhas (Sermo Guelf. 32; PLS 2, 640). Uma mãe não pode dar luz a uma criança sem sofrer. Qualquer parto requer sofrimento, é dor, e tornar-se cristão é um parto. Digamo-lo mais uma vez com palavras do Senhor:  o reino de Deus exige violência (cf. Mt 11, 12; Lc 16, 16), mas a violência de Deus é o sofrimento, é a cruz. Não podemos dar a vida a outros, sem dar a nossa vida. O processo de expropriação acima mencionado é a forma concreta (expressa de muitas formas diferentes) de doar a própria vida. E pensamos na palavra do Salvador:  "...quem perder a sua vida por Mim e pelo Evangelho, salvá-la-á..." (Mc 8, 36).

II. Os conteúdos essenciais da nova evangelização

1. Conversão

No que se refere aos conteúdos da nova evangelização deve-se ter presente em primeiro lugar a inseparabilidade do Antigo e do Novo Testamento. O conteúdo fundamental do Antigo Testamento está resumido na mensagem de João Batista:  Convertei-vos! Não se acede a Jesus sem o Batista; não existe possibilidade de chegar a Jesus sem responder ao apelo do precursor; aliás:  Jesus assumiu a mensagem de João na síntese da sua própria pregação:  convertei-vos e acreditai no Evangelho (cf. Mc 1, 15). A palavra grega converter-se significa:  reconsiderar pôr em questão o próprio modo de viver e o comum; deixar entrar Deus nos critérios da própria vida; não julgar simplesmente de acordo com as opiniões correntes. Converter-se significa por conseguinte:  não viver como vivem todos, não fazer como fazem todos, não sentir-se justificados em ações duvidosas, ambíguas, perversas simplesmente porque há quem o faça; começar a ver a própria vida com os olhos de Deus, portanto procurar o bem, mesmo se não é agradável; não apostar no juízo da maioria, mas no juízo de Deus por outras palavras:  procurar um novo estilo de vida, uma vida nova. Tudo isto não implica um moralismo; a limitação do cristianismo à moralidade perde de vista a essência da mensagem de Cristo:  o dom de uma nova amizade, o dom da comunhão com Jesus e por conseguinte com Deus. Quem se converte a Cristo não pretende criar uma autonomia moral própria, não pretende construir com as próprias forças a sua bondade. "Conversão" (Metanoia) significa precisamente o contrário:  abandonar a auto suficiência, descobrir e aceitar a própria indigência indigência dos outros e do Outro, do seu perdão, da sua amizade. A vida não convertida é auto justificação (não sou pior do que os outros); a conversão é a humildade de se confiar ao amor do Outro, amor que se torna medida e critério da minha própria vida.

Devemos ter também presente o aspecto social da conversão. Sem dúvida, a conversão é em primeiro lugar um ato pessoalíssimo, é personalização. Eu separo-me da fórmula "viver como todos" (já não me sinto justificado pelo facto de que todos fazem o que eu faço) e encontro perante Deus o meu próprio eu, a minha responsabilidade pessoal. Mas a verdadeira personalidade também é sempre uma nova e mais profunda socialização. O eu abre-se de novo ao tu, em toda a sua profundidade, e desta forma nasce um novo Nós. Se o estilo de vida difundido no mundo implica o perigo da despersonalização, do viver não a minha vida mas a vida dos outros, na conversão deve realizar-se um novo Nós do caminho comum com Deus. Ao anunciar a conversão também devemos oferecer uma comunidade de vida, um espaço comum do novo estilo de vida. Não se pode evangelizar só com palavras; o evangelho cria vida, cria comunidade de caminho; uma conversão meramente individual não tem consistência...

2. O Reino de Deus

Na chamada à conversão está implícito como sua condição fundamental o anúncio do Deus vivo. O teocentrismo é fundamental na mensagem de Jesus e também deve ser o centro da nova evangelização. A palavra-chave do anúncio de Jesus é:  Reino de Deus. Mas Reino de Deus não é uma coisa, uma estrutura social ou política, uma utopia. O Reino de Deus é Deus. Reino de Deus significa:  Deus existe. Deus vive. Deus está presente e age no mundo, na nossa na minha vida. Deus não é uma remota "causa última", Deus não é o "grande arquiteto" do deísmo, que construiu a máquina do mundo e agora se encontra fora. Ao contrário:  Deus é a realidade mais presente e decisiva em qualquer ato da minha vida, em todos os momentos da história. Na sua conferência de despedida da cátedra na universidade de Monastério, o teólogo J. B. Metz disse coisas que dele não se esperavam. No passado, Metz ensinou-nos o antropocentrismo o verdadeiro acontecimento do cristianismo teria sido a viragem antropológica, a secularização, a descoberta do secularismo no mundo. Depois, ensinou-nos a teologia política o carácter político da fé; depois a "memória perigosa"; finalmente a teologia narrativa. Depois deste caminho longo e difícil hoje dizemos:  o verdadeiro problema do nosso tempo é a "crise de Deus", a ausência de Deus, camuflada por uma religiosidade vazia. A teologia deve voltar a ser realmente teologia, um falar de Deus e com Deus. Metz tem razão:  para o homem, o "unum necessarium" é Deus. Tudo muda se Deus está ou não está presente. Infelizmente também nós cristãos vivemos muitas vezes como se Deus não existisse ("si Deus non daretur"). Vivemos segundo o slogan:  Deus não está presente, e se está, não tem incidência. Por isso a evangelização deve, antes de mais, falar de Deus, anunciar o único Deus verdadeiro:  o Criador o Santificador o Juiz (cf. Catecismo da Igreja Católica).
Também neste ponto se deve ter presente o aspecto prático. Deus não se pode dar a conhecer unicamente com as palavras. Não se conhece uma pessoa, se não sabemos diretamente nada dela. Anunciar Deus é introduzir na relação com Deus:  ensinar a rezar. A oração é fé em ato. E só na experiência da vida com Deus se manifesta também a evidência da sua existência. Eis por que são tão importantes as escolas de oração, de comunidade de oração. Existe complementariedade entre oração pessoal ("no próprio quarto", sozinhos perante os olhos de Deus), oração comum "paralitúrgica" ("religiosidade popular") e oração litúrgica. Sim, a liturgia é, em primeiro lugar, oração; a sua especificidade consiste no fato que o seu sujeito primário não somos nós (como na oração privada e na religiosidade popular), mas o próprio Deus, a liturgia é actio divina, Deus age e nós respondemos à ação divina.

Falar de Deus e falar com Deus são duas ações que devem andar sempre juntas. O anúncio de Deus orienta para a comunhão com Deus na comunhão fraterna, fundada e vivificada por Cristo. Portanto a liturgia (os sacramentos) não é um tema paralelo à pregação do Deus vivo, mas a concretização da nossa relação com Deus. Neste contexto, seja-me permitida uma observação geral sobre a questão litúrgica. O nosso modo de celebrar a liturgia com frequência é demasiado racional. A liturgia torna-se ensinamento, cujo critério é:  fazer-se compreender a consequência é com frequência a banalização do mistério, o prevalecer das nossas palavras, a repetição das fraseologias que parecem mais acessíveis e mais agradáveis ao povo. Mas isto é um erro não só teológico, mas também psicológico e pastoral. A onda do esoterismo, a difusão de técnicas asiáticas de distensão e auto esvaziamento mostram que nas nossas liturgias falta algo.

Precisamente no nosso mundo de hoje precisamos do silêncio, do mistério supra individual, da beleza. A liturgia não é invenção do sacerdote celebrante ou de um grupo de especialistas; a liturgia (o "rito") cresceu num processo orgânico ao longo dos séculos, leva em si o fruto da experiência de fé de todas as gerações. Mesmo se os participantes talvez não entendam todas as palavras, compreendem o significado profundo, a presença do mistério, que transcende todas as palavras. O celebrante não é o centro da ação litúrgica; o celebrante não está em frente do povo em seu nome não fala se si nem para si, mas "in persona Christi". Não contam as capacidades pessoais do celebrante, mas unicamente a sua fé, na qual se Cristo se torna transparente. "Ele deve crescer e eu diminuir" (Jo 3, 30).

3. Jesus Cristo

Com esta reflexão o tema Deus já se alargou e concretizou no tema Jesus Cristo:  só em Cristo e através de Cristo o tema Deus se torna realmente concreto:  Cristo é Emanuel, o Deus conosco a concretização do "Eu sou", a resposta ao Deísmo. Hoje é grande a tentação de reduzir Jesus Cristo, o único filho de Deus a um Jesus histórico, a um homem puro. Não se nega necessariamente a divindade de Jesus, mas com certos métodos destila-se da Bíblia um Jesus à nossa medida, um Jesus possível e compreensível dentro dos parâmetros da nossa historiografia. Mas este "Jesus histórico" não é "natural", a imagem dos seus autores e não a imagem do Deus vivo (cf. 2 Cor 4, 4 s.; Cl 1, 15). O Cristo da fé não é um mito; o chamado Jesus histórico é uma figura mitológica, auto inventada pelos diferentes intérpretes. Os duzentos anos de história de "Jesus histórico" refletem fielmente a história das filosofias e das ideologias deste período.

No âmbito desta conferência, não posso tratar os conteúdos do anúncio do Salvador. Desejaria brevemente mencionar dois aspectos importantes. O primeiro é o seguimento de Cristo Cristo oferece-se como caminho para a minha vida. Seguimento de Cristo não significa:  imitar o homem Jesus. Uma tentativa como esta falha necessariamente seria um anacronismo. O seguimento de Cristo tem uma meta mais alta:  assimilar-se a Cristo, isto é, alcançar a união com Deus. Estas palavras talvez soem mal aos ouvidos do homem moderno. Mas na realidade todos temos sede do infinito:  de uma liberdade infinita, de uma felicidade sem limites. Toda a história das revoluções dos últimos dois séculos só se explica desta forma. A droga explica-se assim. O homem não se contenta com soluções abaixo do nível da divinização. Mas todos os caminhos oferecidos pela "serpente" (Gn 3, 5), que significa pela sabedoria mundana, falham. O único caminho é a comunhão com Cristo, realizável na vida sacramental. Seguimento de Cristo não é um assunto de moral, mas um tema "místico" um conjunto de ação divina e de resposta da nossa parte.
Desta forma encontramos presente no tema seguimento o outro centro da cristologia, que desejaria mencionar:  o mistério pascal a cruz e a ressurreição. Nas reconstruções do "Jesus histórico" normalmente o tema da cruz não tem significado. Numa interpretação "burguesa" torna-se um acidente em si evitável, sem valor teológico; numa interpretação revolucionária torna-se a morte heroica de um rebelde. Mas a verdade é outra. A cruz pertence ao mistério divino é expressão do seu amor até ao fim (cf. Jo 13, 1). O seguimento de Cristo é participação da sua cruz, unir-se ao seu amor, à transformação da nossa vida, que se torna nascimento do homem novo, criado à imagem de Deus (cf. Ef 4, 24). Quem omite a cruz, omite a essência do cristianismo (cf. 1 Cor 2, 2).

4. A vida eterna

Um último elemento central de qualquer evangelização autêntica é a vida eterna. Hoje devemos anunciar a fé com renovado vigor na vida quotidiana. A este ponto, desejaria mencionar apenas um aspecto da pregação de Jesus que hoje, muitas vezes, é negligenciado:  o anúncio do Reino de Deus é o anúncio do Deus presente, do Deus que nos conhece, nos ouve; do Deus que entra na história, para fazer justiça. Portanto, esta pregação é também anúncio do juízo, anúncio da nossa responsabilidade. O homem não pode fazer ou deixar de fazer o que lhe apetece. Ele será julgado. Deve prestar contas. Esta certeza é válida tanto para os poderosos como para os simples. Onde ela é honrada, são delineados os limites de qualquer poder deste mundo. Deus faz justiça, e só ele o pode fazer por último. Nós consegui-lo-emos tanto mais, quanto mais formos capazes de viver sob o olhar de Deus e de comunicar ao mundo a verdade do juízo. Desta forma, o artigo de fé do juízo, a sua força de formação das consciências, é um conteúdo central do Evangelho e é deveras uma Boa Nova. E também o é para todos os que sofrem sob a injustiça do mundo e procuram a justiça. Compreende-se desta forma o nexo entre o Reino de Deus e os "pobres", os que sofrem e todos aqueles dos quais falam as bem-aventuranças do sermão da montanha. Eles são protegidos pela certeza do juízo, pela certeza que existe a justiça. Eis o verdadeiro conteúdo do artigo sobre o juízo, sobre Deus-juiz:  há justiça. As injustiças do mundo não são a última palavra da história. Existe uma justiça. Só quem não quer que haja justiça, se pode opor a esta verdade. Se tomarmos a sério o juízo e a seriedade da responsabilidade que disso nos advém, compreendemos bem o outro aspecto deste anúncio, isto é, a redenção, o facto de que na cruz Jesus assume os nossos pecados; que o próprio Deus na paixão do Filho se torna advogado de nós, pecadores, e desta forma torna possível a penitência, a esperança para o pecador arrependido, esperança expressa maravilhosamente nas palavras de São João:  diante de Deus, tranquilizaremos o nosso coração, independentemente do que eles nos reprova. "Deus é maior que os nossos corações e conhece todas as coisas" (1 Jo 3, 20). A bondade de Deus é infinita, mas não devemos reduzir esta bondade a uma pieguice afetada sem verdade. Só acreditando no justo juízo de Deus, só tendo fome e sede de justiça (cf. Mt 5, 6) é que abrimos o nosso coração, a nossa vida à misericórdia divina. Vê-se:  não é verdade que a fé na vida eterna torna insignificante a vida terrena. Pelo contrário:  só se a medida da nossa vida for a eternidade, também a vida na terra é grande e o seu valor é imenso. Deus não é o concorrente da nossa vida, mas a garantia da nossa grandeza. Desta forma voltamos ao ponto de partida:  Deus. Se considerarmos bem a mensagem cristã, não falamos de muitas coisas. Na realidade, a mensagem cristã é muito simples. Falamos de Deus e do homem e, desta forma, dizemos tudo.

terça-feira, 9 de março de 2021

5 atitudes feministas que destroem a Mulher

 1) Privilegiar a carreira em detrimento da maternidade

As mulheres não querem mais ser mães. A não ser que tenham uma faculdade, um bom emprego e conquistem a “independência financeira”.
A mulher no mercado de trabalho, não é ruim, mas sim as consequências que isso ocasiona.
Para sustentar um estilo de vida materialista, mulheres tem terceirizado a educação de seus filhos para agentes estatais. Além disso, a média de filhos diminuiu drasticamente para cada mulher, enquanto a idade média da primeira gestação subiu.

2) Libertinagem Sexual
A Revolução Sexual é clara: a mulher deve ser livre para ter relações sexuais aproveitando os prazeres do corpo. Para sustentar essa prática, disseminaram os anticoncepcionais, o aborto, a poligamia. As mulheres foram convencidas que seriam verdadeiramente livres caso distribuíssem seu aparelho reprodutor sem qualquer critério. Mas o que a mulher ganhou com isso? A proliferação de DSTs, uma taxa altíssima de gravidez na adolescência e uma geração de mães solteiras, abandonadas, usadas e largadas.

3) A luta contra os “padrões de beleza”
O Movimento Feminista tem relativizado o conceito de “beleza” no imaginário das mulheres. Cansadas de preservarem sua feminilidade, mulheres aderiram (por preguiça e frustração) ao discurso feminista de “tudo é belo”. Não se importam com o sobrepeso nem com a depilação, com um corte de cabelo proporcional, uma maquiagem harmônica ou roupas decentes. O feio se tornou belo e motivos de vergonha se transformaram em orgulho.

4) Rechaçar o Cavalheirismo
As feministas entendem atos de cavalheirismo e educação dos homens, como manifestações comportamentais geradas pelo patriarcado. Abrir a porta e ser cortês viraram sinônimos de opressão e cultura do estupro. A não ser que chegue a hora de dividir a conta.

5) Se tornar agressiva no cotidiano
O feminismo é subversão. Inverte os papeis feminino e masculino e sua atuação em sociedade. Depois da disseminação de ódio aos homens, muitas mulheres se comportam aos gritos, ordens e exigências, tentando exercer a liderança pelo autoritarismo e não pelas virtudes que lhe são naturais: a docilidade e a misericórdia.

10 Frase aterrorizantes do Feminismo

1 – “Homens que são acusados injustamente de estupro podem, às vezes, aprender com essa experiência.” – Catherine Comins


2 – “No patriarcado, todo filho de uma mulher é seu potencial traidor e também inevitavelmente o estuprador ou explorador de outra mulher.” – Andrea Dworkin

3 – “Todo ato sexual, e mesmo o sexo consentido entre um casal no matrimônio, é um ato de violência perpetuado contra a mulher.” – Catherine MacKinnon

4 – “Chamar um homem de animal é elogiá-lo. Homens são máquinas, são pênis que andam.” – Valerie Solanas

5 – “Todos os homens são estupradores, e isso é tudo que eles são.” – Marilyn French

6 – “Quando uma mulher tem um orgasmo com um homem ela está apenas colaborando com o sistema patriarcal, erotizando sua própria opressão.” – Sheilla Jeffrys

7 – “Eu sinto que odiar os homens é um ato político honrado e viável.” – Robin Morgan

8 – “Uma mulher que faz sexo com um homem, o faz contra a sua vontade, mesmo que ela não se sinta forçada.” – Judith Levine

9 – “Quero ver um homem espancado e sangrando, com um salto alto enfiado em sua boca, como uma maçã na boca de um porco.” – Andrea Dworkin

10 – “O homem é um animal doméstico que, se tratado com firmeza, pode ser treinado e fazer algumas coisas.” – Jilly Cooper

segunda-feira, 1 de março de 2021

Via Sacra de Santo Afonso Maria de Ligório

Primeira Estação - Jesus é condenado à morte

 


Nós te adoramos, ó Cristo, e te bendizemos
Porque com a tua santa Cruz redimiste o mundo

Considera-se nesta primeira Estação a admirável submissão do inocente Jesus no receber do iníquo Pilatos a injusta sentença de morte, para que: os pecadores recebessem a vida, e assim fossem libertos da eterna condenação. Adoro, meu Jesus, aquela divina paciência com a qual do iníquo tribunal de Pilatos recebestes a injustíssima sentença de morte: e pelos méritos de tão bela virtude, peço-vos que apagueis aquela justíssima sentença de eterna morte que tantas vezes me mereceram os meus pecados, e que me chameis no dia final entre os vossos eleitos no céu.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória

Tem misericórdia de nós, Senhor, tem misericórdia de nós

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Segunda Estação - Jesus carrega a cruz

 


Nós te adoramos, ó Cristo, e te bendizemos
Porque com a tua santa Cruz redimiste o mundo

Considera-se nesta segunda estação a resignação de Jesus Cristo ao soto-pôr os seus ombros à cruz a fim de nos animar a caminhar atrás de Si pela via da mortificação e da penitência. Bendigo, meu Jesus, a imensa caridade com a qual, por amor a mim, recebestes sobre vossos ombros feridos a pesadíssima cruz, e Vos peço dar-me a graça de pacientemente levar pela espinhosa estrada do mundo a cruz das minhas labutas, sem separar-me jamais da vossa santíssima vontade.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória

Tem misericórdia de nós, Senhor, tem misericórdia de nós

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Terceira Estação - Jesus cai pela primeira vez

 


Nós te adoramos, ó Cristo, e te bendizemos
Porque com a tua santa Cruz redimiste o mundo

Considera-se nesta terceira estação como o nosso benigníssimo Senhor, oprimido pelo peso da cruz e pelos golpes dos malfeitores, cai por terra, a fim de nos obter a graça de não cairmos jamais em pecado. Beijo, meu Jesus, com todo o afeto aquele terreno que Vós ensopastes do vosso sangue na dolorosa queda que sofrestes sob a cruz. Pelos méritos daquela acerbíssima pena que então sofrestes, peço-Vos que não permitais jamais que eu caia da vossa graça; e no caso de eu me encontrar caído, ressurja logo com uma contrição sincera.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória

Tem misericórdia de nós, Senhor, tem misericórdia de nós

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Quarta Estação - Jesus se encontra com a sua Santíssima Mãe

 


Nós te adoramos, ó Cristo, e te bendizemos
Porque com a tua santa Cruz redimiste o mundo

Considera-se nesta quarta estação a inefável dor que experimentaram reciprocamente Jesus Cristo e a sua Santíssima Mãe ao se encontrarem no caminho do Calvário, a fim de obterem para nós a graça de fugirmos com toda a cautela de todos os encontros perigosos. Oh, pudesse também eu, ó meu Jesus, consumir-me em pranto por compaixão diante de vossos tormentos, a fim de levar-Vos com as minhas lágrimas algum conforto! Neste momento, peço-Vos, ó Jesus, pelas agonias de vossa Mãe, e a Vós também, peço, ó Maria, pelas dores do vosso Filho, que me comovais o coração e façais que, chorando até a morte, possa ter eu a bela sorte de encontrar-vos e gozar convosco para sempre na beatitude do paraíso.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória

Tem misericórdia de nós, Senhor, tem misericórdia de nós

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Quinta Estação - Jesus é ajudado pelo Cireneu

 


Nós te adoramos, ó Cristo, e te bendizemos
Porque com a tua santa Cruz redimiste o mundo

Considera-se nesta quinta estação como Jesus Cristo permite ser ajudado pelo Cireneu a carregar a cruz, a fim de ensinar a nós todos a não nos avergonharmos jamais de levar junto com Ele a cruz misteriosa da pobreza, das doenças, das perseguições e das desgraças. Confundo-me, meu Jesus, ao refletir sobre a repugnância mostrada pelo Cireneu em vos ajudar a levar a cruz, e vos peço humildemente perdão pela pouca resignação com a qual eu mesmo levei até agora a mística cruz dos sofrimentos. Oh, que eu não me abata jamais por qualquer labuta que eu tenha de enfrentar, e que eu reponha sempre minha delícia no viver e morrer crucificado para todos os gostos do mundo.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória

Tem misericórdia de nós, Senhor, tem misericórdia de nós

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Sexta Estação - Jesus é enxugado pela Verônica

 


Nós te adoramos, ó Cristo, e te bendizemos
Porque com a tua santa Cruz redimiste o mundo

Considera-se nesta sexta estação como Jesus Cristo deixou impressa a imagem do seu rosto no pano da Verônica que avançou entre a multidão a fim de enxugá-lo, e com isso nos ensina o dever de desprezar todos os respeitos humanos se queremos ter o seu retrato esculpido no nosso coração. Admiro, meu Jesus, a generosa piedade da Verônica, ao avançar sem temor entre a multidão insolente para enxugar-vos a face toda gotejante de suor e de sangue; e pelos méritos desta tão bela coragem, peço-vos que me deis força para vencer todo o respeito humano e para sempre mais avançar no vosso amor.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória

Tem misericórdia de nós, Senhor, tem misericórdia de nós

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Sétima Estação - Jesus cai pela segunda vez

 


Nós te adoramos, ó Cristo, e te bendizemos
Porque com a tua santa Cruz redimiste o mundo

Considera-se nesta sétima estação como Jesus Cristo cai pela segunda vez sob o peso da sua cruz para nos obter a força de não recairmos nunca em pecado. Oh, não permitais, ó meu Jesus, que com novos pecados eu vos renove as penas atrocíssimas e as horrendas fadigas por vós sofridas na segunda queda! A vossa paixão seja sempre na minha mente e no meu coração a fim de evitá-los com todo o desejo de renovação e de corresponder ao vosso amor com uma fidelidade inalterável no vosso santo serviço.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória

Tem misericórdia de nós, Senhor, tem misericórdia de nós

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Oitava Estação - Jesus fala às mulheres piedosas

 


Nós te adoramos, ó Cristo, e te bendizemos
Porque com a tua santa Cruz redimiste o mundo

Considera-se nesta oitava estação como Jesus Cristo ensinou às mulheres piedosas a chorar por si mesmas em vez de chorar por Ele, a fim de nos ensinar a chorar antes de qualquer coisa os nossos pecados, que foram a causa de todos os Seus sofrimentos. É verdade, ó meu adorável Jesus, que eu tenho mais motivos para chorar os meus pecados que os vossos tormentos, mas se os meus pecados foram a causa de todas as vossas penas, é então meu dever que eu chore por compaixão das vossas dores e por dor dos meus pecados. Concedei-me pois o dom das lágrimas, a fim de que eu chore frutuosamente até a morte, para que eu não tenha de chorar depois inutilmente toda a eternidade no inferno.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória

Tem misericórdia de nós, Senhor, tem misericórdia de nós

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Nona Estação - Jesus cai pela terceira vez

 


Nós te adoramos, ó Cristo, e te bendizemos
Porque com a tua santa Cruz redimiste o mundo

Considerasse nesta nona estação como Jesus Cristo, como reflexo da inutilidade da sua paixão a respeito de muitos, sente-se oprimir de modo a cair pela terceira vez sob a cruz, a fim de nos ensinar que o maior desgosto que nós podemos provocar é o de abusar dos seus benefícios e das suas graças. Não permitais, ó Senhor, que eu esteja no número daqueles que, caminhando num caminho contrário aos vossos exemplos, tornam inúteis para si próprios a vossa paixão e a vossa morte. Sustentai-me com a vossa graça, a fim de que, merecendo estar com os eleitos à vossa direita no dia do juízo, seja com eles introduzido por Vós no reino da glória.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória

Tem misericórdia de nós, Senhor, tem misericórdia de nós

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Décima Estação - Jesus é despido de suas vestes

 


Nós te adoramos, ó Cristo, e te bendizemos
Porque com a tua santa Cruz redimiste o mundo

Considera-se nesta décima estação o rubor experimentado por Jesus Cristo ao ser despido diante de todos, a fim de expiar as nossas vaidades e as nossas imodéstias. Depois amargou o fel para descontar os débitos por nós contraídos por tantas gulodices. Oh, por aquele santo rubor que vos subiu, ó meu Jesus, ao ser publicamente despido das vossas vestes, concedei-me a graça de despir-me de todos os hábitos pecaminosos, e de desprezar corajosamente os boatos dos libertinos e todos os preconceitos do mundo.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória

Tem misericórdia de nós, Senhor, tem misericórdia de nós

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Décima Primeira Estação - Jesus é pregado na cruz

 


Nós te adoramos, ó Cristo, e te bendizemos
Porque com a tua santa Cruz redimiste o mundo

Considera-se nesta décima primeira estação a dolorosa carnificina suportada por Jesus Cristo ao ser estendido e pregado sobre a cruz, a fim de descontar a pena dos pecados que nós cometemos com todos os sentimentos do nosso corpo. Fico horrorizado, meu Jesus, ao pensar na bárbara e desumana atrocidade de vos pregar com tão impiedosos golpes sobre a cruz; e pelos méritos daqueles espasmos que provastes em tão horrenda carnificina, peço-vos que me deis o espírito para crucificar com a mortificação os meus sentidos, a fim de que não possam nunca se rebelar contra a vossa santíssima lei.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória

Tem misericórdia de nós, Senhor, tem misericórdia de nós

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Décima segunda Estação - Jesus morre na cruz

 


Nós te adoramos, ó Cristo, e te bendizemos
Porque com a tua santa Cruz redimiste o mundo

Considera-se nesta décima segunda estação como Jesus Cristo, depois de três horas de penosíssima agonia, morreu em meio a dois ladrões sobre a cruz, a fim de dar a vida a todo o mundo e de tornar doce a nossa morte. Uma vez que, à vossa morte, ó meu Jesus, se conturbaram os céus e a terra, dai-me, peço-vos, uma contrição vivíssima das minhas culpas, para que eu não apareça mais insensível das mesmas coisas insensatas, mas ao invés, com um coração despedaçado pela dor, eu chore continuamente a vossa paixão e morte.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória

Tem misericórdia de nós, Senhor, tem misericórdia de nós

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Décima terceira Estação - Jesus é descido da cruz

 


Nós te adoramos, ó Cristo, e te bendizemos
Porque com a tua santa Cruz redimiste o mundo

Considera-se nesta décima terceira estação a acerbíssima dor de Maria ao ver, entre seus braços, o ensanguentado cadáver de seu Filho. Oh, salvaguardemo-nos de renovar tão grande tormento à Virgem com os nossos pecados, os quais são uma nova crucifixão de Jesus Cristo. Orai conosco, ó grande Virgem, já que o excesso das minhas falhas deram a morte Àquele que era imortal. Eu me doo por isso o quanto posso, e decido sofrer qualquer pena antes que renovar com a minha morte a crucifixão do vosso Filho. Vós, porém, ó Maria, que bem sabeis quanto eu sou frágil e inconstante, obtende-me a força de ser sempre fiel a tão necessário propósito.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória

Tem misericórdia de nós, Senhor, tem misericórdia de nós

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Décima quarta estação Estação - Jesus é colocado no sepulcro

 


Nós te adoramos, ó Cristo, e te bendizemos
Porque com a tua santa Cruz redimiste o mundo

Considera-se nesta última estação a devoção de João, de José de Arimateia, de Nicodemos e das outras piedosas mulheres ao dar digna sepultura a Jesus Cristo. Oh, Reavivemos a fé e tenhamos com relação a Ele os mesmos sentimentos de tristeza, quando, na Sagrada Comunhão, Ele vier se depositar no nosso pobre coração. Para cavar-me do sepulcro dos meus pecados, Vós quisestes descer à tumba, ó meu Jesus; agradeço-vos o quanto posso por um benefício assim tão nobre, e vos peço de completar a vossa obra ao fazer com que, vivendo continuamente na vossa graça, eu mereça viver convosco eternamente na glória.

Pai-nosso, Ave-Maria, Glória

Tem misericórdia de nós, Senhor, tem misericórdia de nós